sábado, 15 de março de 2008

CRISE NA AMÉRICA DO SUL?

10 DE MARÇO DE 2008 - 21h02

Deu zebra, New York Times!
por Bruno Barbosa (Lobão)*


“É difícil acreditar que no século 21 os governos eleitos democraticamente na Colômbia, Equador e Venezuela falem de guerra”. A partir deste comentário introdutório, o diário norte americano The New York Times, em editorial publicado dia 06 de março de 2008, com o titulo: “a América do Sul está em pé de guerra?” passou a deitar regras, com sua peculiar arrogância, aos membros da OEA e aos paises envolvidos recentemente no conflito gerado pela condenável invasão promovida pela Colômbia ao vizinho Equador.
Seguindo a fórmula adotada pela “grande” mídia burguesa, da qual aliás o NYT é uma das musas inspiradoras, concentrou seus principais esforços em desancar as Farc e o Governo Venezuelano como elementos de instabilidade na América Latina.
Críticos abertos dos movimentos e governos populares, sempre manipulando a noticia, optaram por fazer sumir do noticiário o argumento central do governo venezuelano para enviar tropas para a fronteira com a Colômbia, qual seja, o temor, diante do evidente conluio fascista Bush/Uribe, de desdobramento da crise para dentro do território venezuelano uma vez que a Revolução Bolivariana tem sido o principal desafio aos ditames imperialistas nos Andes. Como diz o ditado, boi que acorda cedo bebe água limpa. Chaves não vacilou em defender seu pais. O resto e má fé da grande mídia, sorridente por prestar seu servido de desinformação. Também tem sido omitido, de forma permanente há quatro décadas, o histórico de lutas das Farc contra a oligarquia colombiana, uma das mais aguerridas, violentas e antidemocráticas do continente, status conquistado entre muitas concorrentes temos que reconhecer.
Neste momento, por estarem construindo uma saída humanitária para a troca de reféns, parece irreversível ter a iniciativa política passado às Farc e aos estados interlocutores, Venezuela, Equador e França. Desesperados, Álvaro Uribe e Bush, perceberam a ameaça representada pela potencial adesão internacional à agenda pacifista e decidiram atacar. Mataram o principal negociador da troca humanitária, o histórico guerrilherio Raul Reyes. A agressão fascista, orquestrada desde a Casa Branca, deixou uma escura nuvem de fumaça que vai muito além das selvas equatorianas, atinge toda a América Latina, com seus sinais de perigo para a estabilidade tanto do continente como para todos os demais paises do mundo. Os EUA perseveram com sua doutrina agressiva de guerra ao terror afrontando a soberania dos povos e o direito internacional.
O Imperialismo Estadunidense estimulou a selvageria de Uribe ciente de que isso representaria, no caso da atual troca de reféns das Farc, uma pública e retumbante trombada no Governo Francês. Num momento em que cresce no mundo um leve ensaio do imperialismo europeu em voltar a disputar a hegemonia mundial. A França de Sarkozy, ansiosa por se tornar referência no continente americano a partir da libertação da senhora Ingrid Betancourt esteve ate agora diretamente envolvida nas negociações com as Farc, mantendo representantes acampados nas selvas equatorianas. Isso a mídia alinhada a Washington não destaca no noticiário. Em seu editorial o NYT nem toca no assunto da participação do Governo Francês no imbróglio tratado na OEA.
O jornalão elenca, pateticamente, sua fórmula para que uns e outros as cumpram imediatamente: todos devem passar a perseguir os guerrilheiros das Farc numa guerra sem fronteiras. Ordena também o NYT que “Equador e Colômbia devem rejeitar a intervenção e manipulação do líder da Venezuela”. Deve o “esquerdista Correa” recusar-se, como se estúpido fosse, a dar ouvidos à Venezuela, único estado que de fato se preparou para ajudar a defender o Equador com homens e armas. Aproveito para perguntar se a França, que tem em Chaves seu principal apoio na libertação de reféns, está sob essa ordem também?
Reeditando o principezinho espanhol, o New York Times determina ainda: “Chávez deve ficar quieto. Quanto mais ele se mete, fica mais fácil de acreditar que as acusações contra ele são verdadeiras.“ De novo daria vontade de rir de tamanha empáfia, querendo calar a voz que na América do Sul mais espreme com genuíno antagonismo os interesses do Imperialismo Estadunidense. Mas na verdade não consigo rir diante de tudo isso, os assassinatos que estes senhores da mídia buscam legitimar por ai me enojam.
Segue o NYT: “Recebemos garantias, na quarta-feira, que a Organização dos Estados Americanos decidiu enviar uma comissão para investigar o ataque e convocou uma reunião de ministros do exterior para analisarem os resultados.” Receberam garantias? É de fazer rir a maneira como abordam a decisão da OEA. Seu Governo, Bush, foi fragorosamente derrotado no debates ocorridos na OEA. Não lhes deram garantias, lhes deram uma derrota diplomática e política. Fracassaram os EUA, e seu apadrinhado Governo Uribe, ao tentar barrar o grito da totalidade dos outros paises membros contra a invasão delinqüente promovida no Equador.
Demonstrando falta de informação, o “grande” jornal NYT, acostumado com uma OEA a serviço dos EUA, chega mesmo a ameaçar Equador e Venezuela com condenação tendo por base afirmações do governo da Colômbia de que possui provas inauditas que demonstram conspirações esquerdistas nos Andes destinadas a... neste momento o NYT não afirma nada, nem lhes convém afinal, pois ai já é o terreno onde a mídia marrom aposta nas subjetividades dos leitores, nas construções que o inconsciente realiza de forma sutil e duradoura, apostando nos efeitos de seu veneno.
Mas, e isso merece grande destaque aqui, o maior fracasso dos EUA esta no fato de que, talvez pela primeira vez na sua história, a OEA atuou com dignidade e independência. Com novos e importantes atores agindo com brilho e construindo consensos em torno de princípios que negam e renegam as doutrinas do fascismo.
Quanto a isso é preciso parabenizar a diplomacia brasileira por sua atuação firme e determinante para o isolamento das posições defendidas pelos EUA/Colômbia. Ao contrário do que pensa o NYT quem recebeu garantias neste processo fomos nós, povos latino-americanos, de que os estados do continente têm espaço para manter suas cabeças erguidas e de que os movimentos sociais devem permanecer alinhados, e vigilantes em seu avanço por justiça, democracia e soberania.
Por fim, pensando melhor sobre a frase introdutória do editorial do NYT que diz “É difícil acreditar que no século 21 os governos eleitos democraticamente... falem de guerra”, acabei concluindo que pode haver ai uma certa mea culpa velada, afinal pensar em guerras de agressão em pleno século 21 é mesmo coisa de ditadura fascista.



*Bruno Barbosa (Lobão), Bacharel em Direito (UFMG)

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