sexta-feira, 30 de maio de 2008

ESTUDANDO E APRENDENDO....

Neste momento é importante que reflitamos sobre a nossa condição mediúnica , estudando e aprendendo...

Médiuns Irresponsáveis

Manoel Philomeno de Miranda (espírito)


Associou-se indevidamente à pessoa portadora de mediunidade ostensiva à qualidade de Espírito elevado.

O desconhecimento do Espiritismo ou a informação superficial sobre a sua estrutura deu lugar a pessoas insensatas considerarem que, o fato de alguém ser possuidor de amplas faculdades medianímicas, caracteriza-se como um ser privilegiado, digno de encômios e projeção, ao mesmo tempo possuidor de um caráter diamantino, merecendo relevante consideração e destaque social.

Enganam-se aqueles que assim procedem, e agem perigosamente, porquanto, a mediunidade é faculdade orgânica, de que quase todos os indivíduos são portadores, variando de intensidade e de recursos que facultem o intercâmbio com os Espíritos, encarnados ou não.

Neutra, do ponto de vista moral, em si mesma, a mediunidade apresenta-se como oportunidade de serviço edificante, que enseja ao seu portador os meios de auto-iluminar-se, de crescer moral e intelectualmente, de ampliar os dons espirituais, sobretudo, preparando-se para enfrentar a consciência após a desencarnação.

Às vezes, Espíritos broncos e rudes apresentam admiráveis possibilidades mediúnicas, que não sabem ou não querem aproveitar devidamente, enquanto outros que se dedicam ao Bem, que estudam as técnicas da educação das faculdades psíquicas, não conseguem mais do que simples manifestações, fragmentárias, irregulares, quase decepcionantes.

Não se devem entristecer aqueles que gostariam de cooperar com a mediunidade ostensiva, porquanto a seara do amor possui campo livre para todos os tipos de serviço que se possa imaginar.

Ser médium da vida, ajudando, no lar e fora dele, exercitando as virtudes conhecidas, constitui forma elevada de contribuir para o progresso e desenvolvimento da Humanidade.

Através da palavra, oral e escrita, quantos socorros podem ser dispensados, educando-se as criaturas, orientando-as, levando-as à edificação pessoal, na condição de médium do esclarecimento?!

Contribuindo, nas atividades espirituais da Casa Espírita, pela oração e concentração durante as reuniões especializadas de doutrinação, qualquer um se torna médium de apoio.

Da mesma forma, através da aplicação dos passes, da fluidificação da água, brindando a bioenérgia, logra-se a posição de médium da saúde.

Na visita aos enfermos, mantendo diálogos confortadores, ouvindo-os com paciência e interesse, amplia-se o campo da mediunidade de esperança.

Mediante o dialogo com os aturdidos e perversos, de um ou do outro plano da vida, exerce-se a mediunidade fraternal da iluminação de consciência.


Neste mister, aguça-se a percepção espiritual e desenvolvem-se os pródromos das faculdades adormecidas, que se irão tornando mais lúcidas, a fim de serem usadas dignamente em futuros cometimentos das próximas reencarnações.

Ser médium é tornar-se instrumento; e, de alguma forma, como todos nos encontramos entre dois pontos distantes, eis-nos incursos na posição de intermediários.

Ter facilidade, porém, para sentir os Espíritos é compromisso que vai além da simples aptidão de contatá-los.

Desse modo, à semelhança da inteligência que se pode apresentar em indivíduos de péssimo caráter, que a usam egoística, perversamente, ou como a memória, que brota em criaturas desprovidas de lucidez intelectual, e perde-se, pela falta de uso, também a mediunidade não é sintoma de evolução espiritual.

Allan Kardec, que veio em nobre missão, Espírito evoluído que é, viveu sem apresentar qualquer faculdade mediúnica ostensiva, enquanto outros indivíduos do seu tempo, que exerceram a faculdade medianímica, por inferioridade moral, venderam os seus serviços, enxovalharam-na, criaram graves empecilhos à divulgação da Doutrina Espírita que, indevidamente, foi confundida com os maus exemplos desses médiuns inescrupulosos e irresponsáveis.

Certamente, o médium ostensivo, aquele que facilmente se comunica com os Espíritos, quando é dotado de sentimentos nobres e possui elevação, torna-se missionário do Bem nas tarefas a que vai convocado, ampliando os horizontes do pensamento para a imortalidade, para a vitória do ser libertado de todas as paixões primitivas.

Normalmente, e as exceções são subentendidas, os portadores de mediunidade ostensivas, porque se encontram em provações reparadoras, falham no desiderato, após o deslumbramento que provocam e a auto-fascinação a que se entregam por invigilância e presunção.

Toda e qualquer expressão de mediunidade exige disciplina, educação, correspondente conduta moral e social do seu portador, a fim de facultar-lhe a sintonia com Espíritos Superiores, embora o convívio com os infelizes, que lhe cumpre socorrer.

O médium irresponsável, porém, não é apenas aquele que, ignorando os recursos de que se encontra investido, gera embaraços e perturbações, tombando nas malhas da própria pusilanimidade, mas também, aqueloutros que, esclarecidos da gravidade do compromisso, se permitem deslizes morais, veleidades típicas do caráter doentio, terminando vitimados pelas obsessões cruéis.

Todo aquele, portanto, que deseje entregar-se ao Bem, na seara dos médiuns, conscientize-se da responsabilidade que lhe diz respeito, e, educando a faculdade, torne-se apto para o ministério, servindo sempre e crescendo intimamente com os olhos postos no próprio e no futuro feliz da sociedade.



Por isso é que defendemos tanto o estudo sistemático para os Médiuns ...
Vamos em frente!

segunda-feira, 26 de maio de 2008

VIVENDO UMA EXPERIÊNCIA....

Gosto de tomar o passe com o Seu ... porque me sinto bem e estou me acostumando com ele . Foi bom desde o início.


Esta é uma postura muito comum entre os irmãos que chegam às Casas Espíritas e decididamente não é uma atitude muito positiva. Além de criar algumas ligações desnecessárias ,pode levantar disputas , intrigas e problemas entre médiuns e pacientes. Devemos nos lembrar que o passe é troca de energias e que o Bem que recebemos deve ser compartilhado sem nenhum tipo de preferência . Nós não podemos nos negar ao trabalho do passe , mas devemos evitar escolhas pessoais . Devemos nos lembrar e lembrar aos outros que a energia utilizada por nós no passe é de origem espiritual e , nós , somos apenas intermediários nesse processo comandado pelas forças de luz. Nós , médiuns , devemos nos esforçar em dar o nosso melhor sem criar preferência entre este ou aquele irmão. Por isso é interessante que nos preparemos para o trabalho e nos coloquemos nas mãos dos nossos Companheiros Espirituais , sem esquecer dos nossos melhores sentimentos, tão importantes nessa ocasião.

Mais tarde voltamos...

domingo, 25 de maio de 2008

SOBRE A IMPORTANCIA DA DOUTRINA PARA O ESPÍRITA...

"Enquanto a Ciência avança em busca de informações, uma grande parte de adeptos da doutrina espírita prefere procurar a salvação pelas mais variadas formas possíveis.
Poucos estão preocupados, deveras, com o conhecimento e com as verdades espiríticas.
Muitos são os que confiam na esperança de que Jesus, de fato, seja o salvador, outros praticam a "caridade" acintosa com o intuito de se salvarem às custas do que pregou Kardec e alguns poucos pugnam pelo estudo doutrinário com o fito de trazer o conhecimento da razão para que a verdade espírita triunfe, pois, sem dúvida, os novos conhecimentos humanos já não mais comportam hipóteses materialistas na formação universal." CVDEE - Centro Virtual de Divulgação e Estudo do Espiritismo



Sem desmereçer nem desqualificar nenhum dos seus propósitos , acredito firmemente que a mais importante influência que a Doutrina Espírita pode exercer sobre nós , os seus praticantes , está justamente no estímulo para que possamos empreender em nós e em nossas vidas a nossa verdadeira transformação moral. E para tal , penso que a dedicação , a seriedade e o estudo serão os nossos maiores aliados neste processo . É dessa forma que, acredito , poderemos caminhar na direção da nossa tão necessária mudança . De dentro para fora . Aos poucos , mas fortes e conscientes . É a seriedade de propósito aliada com o estudo que fortaleçerá a nossa dedicação .
Por acreditar nesses motivos , é que venho vivendo uma das mais ricas experiências desde que me coloquei como trabalhador no Lar de Frei Luiz , atualmente junto a um grupo de irmãos , na tarefa de preparar médiuns , especialmente em atividades práticas de passes . Além de experimentar individualmente processos bem significativos no campo mediúnico , tenho podido participar coletivamente de uma equipe bem centrada e harmonica que tem a principal tarefa de estimular uma postura crítica , consciente e segura no que diz respeito ao exercício do mandato mediúnico.
Assim , vejo como bastante oportuna a citação acima, para a efetiva sustentação de intenção e propósito das nossas atitudes , na nossa vida ....


Vamos falando disso mais adiante....

terça-feira, 6 de maio de 2008

OS TRABALHADORES DA ÚLTIMA HORA

OS TRABALHADORES DA ÚLTIMA HORA

Silvio Seno Chibeni

1. Introdução

Como todo estudioso do Espiritismo sabe, o título do presente artigo é o título dado por Allan Kardec ao capítulo 20 de O Evangelho Segundo o Espiritismo. O que poucos talvez tenham notado é que esse é o único capítulo do livro que não possui comentários do próprio Kardec: à transcrição da passagem evangélica – a intrigante parábola dos trabalhadores da última hora – seguem-se imediatamente as Instruções dos Espíritos, em número de quatro. Isso, porém, não passa de detalhe curioso, já que os textos de Kardec e os dos Espíritos expressam um pensamento uno, não sendo raro que os primeiros superem os segundos em alcance, clareza e precisão. O que mais importa são os ensinamentos contidos no capítulo. Iremos, por economia de espaço, restringir nossa análise à parábola e ao primeiro texto escolhido por Kardec para comentá-la, de autoria de Constantino, Espírito Protetor, recebida em Bordeaux em 1863.

2. A parábola

Para comodidade do leitor, transcreveremos agora todo o texto da parábola citado por Kardec. Notemos, desde já, que se trata de uma das muitas ocasiões em que Jesus procura ensinar algo sobre Deus e as leis divinas – “o reino dos céus” – por meio de uma comparação com uma estória envolvendo coisas e situações ordinárias. Eis a parábola, registrada em Mateus 20:1-16:

O reino dos céus é semelhante a um pai de família que saiu de madrugada, a fim de assalariar trabalhadores para a sua vinha. – Tendo convencionado com os trabalhadores que pagaria um denário a cada um por dia, mandou-os para a vinha. – Saiu de novo à terceira hora do dia e, vendo outros que se conservavam na praça sem fazer coisa alguma, – disse-lhes: Ide também vós outros para a minha vinha e vos pagarei o que for razoável. Eles foram. – Saiu novamente à hora sexta e à hora nona do dia e fez o mesmo. – Saindo mais uma vez à hora undécima, encontrou ainda outros que estavam desocupados, aos quais disse: Por que permaneceis aí o dia inteiro sem trabalhar? – É, disseram eles, que ninguém nos assalariou. Ele então lhes disse: Ide vós também para a minha vinha. – Ao cair da tarde disse o dono da vinha àquele que cuidava dos seus negócios: Chama os trabalhadores e paga-lhes, começando pelos últimos e indo até aos primeiros. – Aproximando-se então os que só à undécima hora haviam chegado, receberam um denário cada um. – Vindo a seu turno os que tinham sido encontrados em primeiro lugar, julgaram que iam receber mais; porém, receberam apenas um denário cada um. – Recebendo-o, queixaram-se ao pai de família, – dizendo: Estes últimos trabalharam apenas uma hora e lhes dás tanto quanto a nós que suportamos o peso do dia e do calor. – Mas, respondendo, disse o dono da vinha a um deles: Meu amigo, não te causo dano algum; não convencionaste comigo receber um denário pelo teu dia? – Toma o que te pertence e vai-te; apraz-me a mim dar a este último tanto quanto a ti. – Não me é então lícito fazer o que quero? Tens mau olho, porque sou bom? – Assim, os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos, porque muitos são os chamados e poucos os escolhidos.

3. Começando a entender...

Das parábolas evangélicas, algumas são de compreensão relativamente fácil, como a do bom samaritano (Lc 10:25-37) ou a do semeador (Mt 13:1-9), que o próprio Jesus explicou aos discípulos (Mt 13:18-23). Outras, porém, trazem dificuldades interpretativas consideráveis, exigindo mais meditação e maior familiaridade com o conjunto da doutrina cristã para que um sentido razoável seja alcançado. Dissemos um sentido, porque a riqueza alegórica dessas estórias contadas pelo Mestre em geral deixa aberta a possibilidade de diversas interpretações.
A parábola dos trabalhadores da última hora seguramente pertence à classe das parábolas “difíceis”, já que compara o reino dos céus, onde tudo é justiça, com uma situação aparentemente injusta: a remuneração igual a jornadas de trabalho desiguais.
Não obstante essa dificuldade central, a parábola contém, felizmente, alguns pontos mais ou menos claros, com os quais devemos principiar nossos esforços interpretativos. Trata-se de várias “pontes” que ligam os elementos da estória com o reino dos céus:

o pai de família – Deus
a vinha – o Universo
os trabalhadores – os seres humanos
o trabalho na vinha – o trabalho no bem
as horas – qualquer período de tempo
o salário – a felicidade
Embora nem todas as ligações sugeridas sejam triviais, acreditamos que sejam as que mais naturalmente ocorrem a quem se dedique a entender o texto evangélico. O sentido geral do ensinamento é que é difícil de apreender, dado o aparente conflito da idéia de um Deus justo com o modo pelo qual o senhor da vinha remunerou os trabalhadores. Logicamente, só temos duas opções para eliminar o conflito: ou supomos que Jesus de fato pretendeu caracterizar Deus como injusto; ou revemos nossa impressão inicial, de que o comportamento do senhor da vinha foi injusto. Ora, como a primeira alternativa é insustentável, face ao conjunto dos ensinamentos cristãos, temos de desenvolver a segunda opção. Para tanto, comecemos atentando para o seguinte:
a) a)O pai de família pagou aos trabalhadores da primeira hora exatamente o valor combinado, de modo que não os prejudicou, como ele mesmo lembrou quando eles se queixaram;
b) b)Quanto aos demais, a parábola nada diz sobre acerto de salário, sugerindo-nos que os trabalhadores aceitaram a oferta de trabalho sem pré-condições;
c) c)O próprio senhor da vinha justifica sua ação, dizendo que foi um ato de bondade: o denário que mandou dar aos que foram convocados mais tarde seria, pois, parte remuneração pelas horas que trabalharam e parte auxílio espontâneo.
Assim, quando consideramos os casos separadamente vemos que em suas relações com cada grupo de obreiros o senhor nada fez de errado.
Mas mesmo nos termos em que a questão é colocada no item (c), ficamos incomodados com o fato de que o senhor distribuiu o benefício-extra desigualmente: quanto mais tarde chegaram, menor a parcela do denário correspondente à remuneração, e portanto maior a que representaria o auxílio.
Talvez seja útil transpor a questão para situações de nosso dia-a-dia. Quando saímos pela rua e damos esmolas desiguais a dois pedintes estaremos sendo injustos? Quando contribuímos, em trabalho ou dinheiro, com duas instituições de caridade, porém em maior medida a uma do que à outra, é injustiça?
Nossas reflexões sobre esse problema podem ser auxiliadas pelas considerações expendidas por Constantino na mencionada instrução. Passemos, pois, a ela.

4. Recorrendo a Constantino...

O texto de Constantino compõe-se de quatro parágrafos, que passam gradativamente aos níveis interpretativos mais alegóricos da parábola. O curto parágrafo inicial atém-se ainda de forma quase que exclusiva ao sentido literal do texto evangélico:
[§ 1] O obreiro da última hora tem direito ao salário, mas é preciso que a sua boa-vontade o haja conservado à disposição daquele que o tinha de empregar e que o seu retardamento não seja fruto da preguiça ou da má-vontade. Tem ele direito ao salário, porque desde a alvorada esperava com impaciência aquele que por fim o chamaria para o trabalho. Laborioso, apenas lhe faltava o labor.
Vemos que o Espírito destaca alguns aspectos importantes que ainda não havíamos considerado. Há uma condição para o recebimento do denário: a disposição permanente para o trabalho. Aqueles que foram contratados à terceira, sexta, nona e undécima hora tinham boa-vontade, ansiavam por trabalhar. Faltou-lhes, porém, a oportunidade. Quando o senhor da vinha os convocou, aceitaram pressurosamente e, segundo se depreende, sem sequer inquirir pela remuneração.
Visando a realçar esse ponto, no segundo parágrafo Constantino estende a parábola para uma hipotética situação contrastante:
[§ 2] Se, porém, se houvesse negado ao trabalho a qualquer hora do dia; se houvesse dito: “tenhamos paciência, o repouso me é agradável; quando soar a última hora é que será tempo de pensar no salário do dia; que necessidade tenho de me incomodar por um patrão a quem não conheço e não estimo! quanto mais tarde, melhor”; esse tal, meus amigos, não teria tido o salário do obreiro, mas o da preguiça.
As disposições positivas dos trabalhadores da última hora podem, assim, ser entendidas como fatores que sensibilizaram o pai de família, induzindo-o ao gesto de generosidade.
Ademais, vale lembra que ao perguntar, no item 930 de O Livro dos Espíritos, acerca da situação das pessoas que se vêm impossibilitadas de trabalhar por causas independentes de sua vontade, Kardec obtém a observação de que “Numa sociedade organizada segundo a lei do Cristo ninguém deve morrer de fome”. E, explicando o ponto, os Espíritos acrescentam: “Com uma organização social criteriosa e previdente, ao homem só por culpa sua pode faltar o necessário.” É, pois, uma clara alusão à solidariedade que os homens devem se esforçar por implantar no mundo.
Felizmente, notamos que esse pensamento, de vanguarda para a época, já vem se difundindo entre as lideranças mais lúcidas de nossa sociedade, tanto assim que em muitos países já existe o seguro-desemprego, para acudir aos trabalhadores que contingencialmente se encontrem sem oportunidade de emprego. Nenhuma pessoa sensata classificaria de injusto esse dispositivo, muito pelo contrário.
Ora, nessa perspectiva o senhor da parábola seria alguém que, mesmo naqueles tempos primitivos, teria sido tocado pela dificuldade daqueles homens que impacientemente esperavam pela oportunidade de ganhar seu pão, solidarizando-se com eles por meio, primeiro, da oferta de trabalho e, depois, pelo auxílio pecuniário adicional.
Afastando-nos agora um pouco do sentido literal da estória, ensaiemos a sua interpretação em termos do “reino dos céus”. Com base no que foi visto até aqui, infere-se que com a parábola Jesus procurou salientar a virtude da boa-vontade e da disposição para o trabalho. Num plano mais amplo, o trabalho não deve, é claro, ser entendido unicamente como o trabalho ordinariamente assim considerado, as atividades braçais e intelectuais passíveis de remuneração. “Toda ocupação útil é trabalho”, conforme a resposta à questão 675 de O Livro dos Espíritos. Tudo o que concorra para o desenvolvimento próprio, do semelhante e, em geral, da criação, é trabalho, nessa conceituação estendida.
A mensagem mais evidente da parábola é, pois, a importância de nosso engajamento nas atividades da “vinha” universal. Ele traz para nós o “salário” da felicidade: o bem-estar físico, a satisfação intelectual, o prazer do cultivo do Belo, a tranqüilidade moral.
A diversidade dos grupos de trabalhadores da parábola indica a diversidade dos seres criados e das tarefas a desempenhar em cada estágio de sua evolução. Deus reconhece essa diversidade, convocando cada um a seu tempo para as tarefas adequadas ao momento. E contanto que haja disposição para o trabalho, todos recebem o fruto de seus labores, por mais modestos que sejam. Não espera o Senhor que, num dado “dia” todos desempenhem as mesmas tarefas. A meta de todos deve ser a de colaborar cada vez mais na obra divina, mas a convocação divina leva em conta a capacidade presente de cada um. A nós cabe estar permanentemente dispostos ao labor, para que não sejamos como os servos imaginados por Constantino, que receberam somente o “salário da preguiça”, ou seja, a estagnação evolutiva.
Não somente a preguiça e a indiferença têm de ser evitadas, mas também a afoiteza e a precipitação. Por falta de bom-senso, arriscamo-nos freqüentemente em tarefas para as quais não estamos, presentemente, preparados. Pior ainda: movidos pelo orgulho lançamo-nos em empreendimentos que se nos afiguram “grandes”, não pelo bem que deles decorra, mas pela evidência em que nos coloquem. O malogro parcial ou total, e a dura decepção de nossa vaidade é o resultado inevitável de tais iniciativas.
A igualdade dos “pagamentos” que cada trabalhador de boa-vontade recebe reflete a bondade divina, que valoriza tudo aquilo que venhamos a fazer na obra do bem. Não ressaltou Jesus esse ponto na expressiva passagem do óbolo da viúva? (Ver Mc 12:41-44 e Lc 21:1-4, bem como os comentários de Kardec a essa passagem no item 6 do capítulo 13 de O Evangelho Segundo o Espiritismo.)
Outra virtude veladamente evocada pela parábola é o desinteresse. Conforme já notamos, os trabalhadores da última hora e todos os demais que foram convocados depois do início do dia aceitaram a oferta de trabalho sem perguntar quanto ganhariam. Do mesmo modo, nossa meta é fazer o bem pelo bem, tão logo a ocasião apareça, e não “por cálculo”, contabilizando os benefícios que dele nos advenham. Kardec sabiamente inseriu um estudo sobre esse ponto logo após o referente ao óbolo da viúva, nos itens 7 e 8 do capítulo 13 deO Evangelho Segundo o Espiritismo. Todo esse capítulo, aliás, contém reflexões valiosas sobre o assunto, complementando as fundamentais elucidações contidas na seção inicial do capítulo “Da perfeição moral” de O Livro dos Espíritos.
Por fim, além da indolência e do interesse, mais um vício parece ser exprobrado na parábola: a inveja (“Tens mau olho, porque sou bom?”). Vendo o gesto de generosidade do pai de família, os trabalhadores da primeira hora queixaram-se, muito embora no que lhes dissesse respeito ele houvesse agido com correção. Aproveitando uma sugestão interpretativa feita anteriormente, seria mais ou menos como se nos queixássemos do governo por conceder auxílio-desemprego a um colega provisoriamente desempregado. Além de injustificável inveja, faltaríamos com a solidariedade, que deve reinar entre os homens em geral. (Questão deixada para o leitor: Quem os trabalhadores da primeira hora poderiam simbolizar?)

5. Ainda com Constantino...

Após ter comentado, assim, a situação dos preguiçosos e indiferentes, Constantino prossegue, penúltimo parágrafo da mensagem:
[§ 3] Que dizer, então, daquele que, em vez de apenas se conservar inativo, haja empregado as horas destinadas ao labor do dia em praticar atos culposos; que haja blasfemado de Deus, derramado o sangue de seus irmãos, lançado a perturbação nas famílias, arruinado os que nele confiaram, abusado da inocência, que, enfim, se haja cevado em todas as ignomínias da Humanidade? Que será desse? Bastar-lhe-á dizer à última hora: Senhor, empreguei mal o meu tempo; toma-me até ao fim do dia, para que eu execute um pouco, embora bem pouco, da minha tarefa, e dá-me o salário do trabalhador de boa vontade? Não, não; o Senhor lhe dirá: “Não tenho presentemente trabalho para te dar; malbarataste o teu tempo; esqueceste o que havias aprendido; já não sabes trabalhar na minha vinha. Recomeça, portanto, a aprender e, quando te achares mais bem disposto, vem ter comigo e eu te franquearei o meu vasto campo, onde poderás trabalhar a qualquer hora do dia.”
Agora não se trata mais da indolência do servo que despreza o trabalho, mas da ação destrutiva daquele que, ao invés de ajudar, atrapalha a obra divina. A extensão dos comentários de Constantino para esse tópico é particularmente relevante para nós, Espíritos ligados à Terra. A observação dos fatos confirma a classificação de Kardec na seção “Destinação da Terra – Causas das misérias humanas”, do capítulo 3 de O Evangelho Segundo o Espiritismo, da Terra como planeta especialmente destinado ao abrigo de Espíritos desajustados com as leis divinas. Como reafirmaria depois Emmanuel, “todas as entidades espirituais encarnadas no orbe terrestre são Espíritos que se resgatam ou aprendem nas experiências humanas, após as quedas do passado, com exceção de Jesus-Cristo...” (O Consolador, questão 243).
Também sabemos, à luz dos ensinos cristãos e espíritas, que nossa interferência indébita na harmonia universal traz para nós conseqüências negativas, sofrimentos e tribulações que visam a impor limites à nossa ação maléfica, despertando-nos para o bem. Não desenvolveremos esse tema aqui, por sobejamente explorado na boa literatura espírita.
Centremos nossa atenção nas singulares palavras de Constantino. Como entender a reação atribuída ao Senhor, diante do servo mau: “Não tenho presentemente trabalho para te dar...” ? Tolher-nos-ia Deus a oportunidade do trabalho depois que falimos? Sabemos, por outro lado, que é somente pelo trabalho no bem que repararemos nossos erros, apagando suas repercussões. (Ver o “Código penal da vida futura”, no capítulo 7 da primeira parte de O Céu e o Inferno.)
Inspecionando mais atentamente o texto, vemos que o Senhor não impede para sempre o servo “cevado em todas as ignomínias” de trabalhar em sua vinha. Depois que reaprender a trabalhar construtivamente, ser-lhe-á novamente franqueado o vasto campo de ação na vinha.
Mas por que esse impedimento temporário? É que a prática do mal pode de tal forma destrambelhar-nos que, por algum tempo, naturais limitações nos advirão. Seria como um motorista insensato, que provoca um acidente e vai hospitalizado. Enquanto permanecer internado, não poderá desenvolver todas as atividades para as quais estaria em princípio capacitado. É um período de recomposição.
Do mesmo modo, aos nossos desatinos espirituais sobrevém um estágio de reequilíbrio, de aprendizado pela dor, de reflexão. Se, porém, esse estágio no “hospital” divino nos limita em alguns aspectos – as idiotias, as paralisias, as enfermidades degenerativas incuráveis, a miséria extrema, etc. – sempre resta-nos a possibilidade de agir no bem pela paciência e resignação, pelos esforços para corrigir-nos, pela gratidão a quem nos auxilie, pelo sorriso de esperança, e por tantas outras formas.

6. Seriam os espíritas os trabalhadores da última hora?

Concluindo este nosso estudo, vejamos agora o último parágrafo do texto de Constantino. Com base nele, bem como numa passagem da Instrução que o segue, de Henri Heine, difundiu-se no meio espírita a idéia de que “os espíritas são os trabalhadores da última hora”. Não é raro vermos esse pensamento exposto até mesmo com uma certa ponta de orgulho. Afinal, na parábola os trabalhadores da undécima hora são aqueles que mais se beneficiaram da magnanimidade do senhor. Estaríamos todos, então, admitidos à vinha, com salário integral e tudo.
Será isso o que os Espíritos escreveram, ou deram a entender? Examinaremos aqui apenas o que diz Constantino, pois a mensagem de Heine parte de uma perspectiva diferente e requereria outro artigo. Eis o parágrafo:
[§ 4] Bons espíritas, meus bem-amados, sois todos obreiros da última hora. Bem orgulhoso seria aquele que dissesse: Comecei o trabalho ao alvorecer do dia e só o terminarei ao anoitecer. Todos viestes quando fostes chamados, um pouco mais cedo, um pouco mais tarde, para a encarnação cujos grilhões arrastais; mas há quantos séculos e séculos o Senhor vos chamava para a sua vinha, sem que quisésseis penetrar nela! Eis-vos no momento de embolsar o salário; empregai bem a hora que vos resta e não esqueçais nunca que a vossa existência, por longa que vos pareça, mais não é do que um instante fugitivo na imensidade dos tempos que formam para vós a eternidade.
A leitura atenta deste trecho não parece corroborar a referida interpretação. Primeiro, a frase inicial qualifica os espíritas: “Bons espíritas...”. O adjetivo ‘bons’ em geral passa despercebido! Logo, a frase não diz respeito aos espíritas em geral, mas aos bons espíritas. E todos conhecemos a impressionante lista de qualidades dos bons espíritas, que Kardec registrou no capítulo 17 do Evangelho Segundo o Espiritismo, seções “O homem de bem” e “Os bons espíritas”.
Além disso, a frase não tem o artigo definido ‘os’ antes de ‘obreiros da última hora’, como normalmente se diz. A inclusão do artigo emprestaria ao pensamento um ar de sectarismo e orgulho incompatível com a índole da doutrina espírita. Os bons espíritas não são os obreiros da última hora, com a implícita exclusão dos outros homens, mas simplesmente obreiros da última hora. Eles são aqueles que passaram, numa “hora” relativamente recente da história da humanidade, a trabalhar, ao lado de tantos outros, na vinha do Senhor.
E mais: nem mesmo entendida corretamente a comparação de Constantino serviria de fundamento a qualquer sentimento ufanista no meio espírita. Afinal, os trabalhadores da última hora não tiveram nenhum mérito relativamente aos da primeira hora. Simplesmente são aqueles para quem, por uma razão ou por outra, a tarefa chegou um pouco mais tarde.
Prosseguindo, o Espírito modifica um pouco a alegoria, ao salientar que mesmo estes em geral ignoraram durante séculos os apelos do Senhor para o trabalho na vinha! A rigor, então, os bons espíritas não deveriam se orgulhar nem mesmo de terem sempre estado aguardando ansiosamente o chamado para a obra divina. Estão, via de regra, na condição geral da humanidade terrena, de Espíritos que fizeram mau uso de seu livre-arbítrio em passado próximo ou distante.
No entanto, o que os caracteriza – sem a exclusão de outros, repetimos – é que agora já superaram aquele período de “hospitalização”, e reaprenderam a trabalhar no bem. Esse o seu maior salário: a bênção de já poderem trabalhar na construção de sua felicidade, mediante o amor ativo ao próximo e a si mesmos.
Que dizer agora dos espíritas que ainda não podem ser ditos bons? Esses são os que, não obstante terem as luzes dos princípios espíritas ao seu alcance, ainda resistem indolentemente a trabalhar, ou a trabalhar tanto quanto sua condição permitiria; ou aqueles, em condição mais lastimável ainda, que ainda se “cevam nas ignomínias” morais, sem envidar esforços para emendar-se.
É claro que essa classificação não é nítida, ou seja, não há apenas dois grupos de espíritas. Há uma gradação contínua, começando naqueles francamente retardatários e terminando nos que já entendem e vivenciam plenamente as diretrizes divinas para os homens. Caberá a nós determinar, pelo exame isento de nossos pensamentos e atos, nossa posição nessa escala, e incessantemente procurar galgar posições cada vez mais avançadas, pela reparação de nossos erros, pela superação de vícios e conquista de virtudes.

Referências Bibliográficas

EMMANUEL.O Consolador. (Médium Francisco Cândido Xavier.) 8a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, 1940.
KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. Trad. de Guillon Ribeiro. 43a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s.d.
–––. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Trad. de Guillon Ribeiro. 111a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s.d.
–––. O Céu e o Inferno. Trad. de Manuel Quintão. 28ª edição, Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s.d.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

FORMAÇÃO E INFORMAÇÃO NA DOUTRINA ESPÍRITA

Sobre a Formação e a Informação na Doutrina Espírita :
pensando em algumas questões para se formular uma proposta para o Desenvolvimento da Educação Mediúnica .


Marco Aurélio Faria Rezende



“Espíritas, amai-vos! Este o primeiro ensino! Instrui-vos, este o segundo.”
João .Cap. V1, 5.


“Estudar e servir são rotas inevitáveis na obra de elevação.”
Emmanuel






No mundo inteiro , todas as sociedades estão correndo para entrar numa nova fase da história do homem . Nesta fase, o essencial é que a Informação passou a desempenhar um papel importante no cotidiano da humanidade . É fundamental , então , que todos nós que compomos muitos grupos sociais passemos a nos articular com todo o Conhecimento produzido , afim de que possamos alcançar uma relativa igualdade de condição na árdua tarefa de nos mantermos atuantes e vivos enquanto sujeitos no processo de Desenvolvimento que deve estar disponível para todo mundo. Essa articulação é essencial para sustentar todos os dias as novas formas de relação entre os diversos grupos de indivíduos que compomos e gerar o entendimento de que a Informação , o Conhecimento e o Desenvolvimento devem ser alvos comuns de todos .
Dentro dessa visão , podemos perceber duas possibilidades predominantes - a primeira que estabelece um monopólio para o uso de todas as tecnologias decorrentes desse processo por poucos e a segunda que propõe a criação de uma sociedade globalizada onde todos os seus indivíduos se utilizariam igualmente de toda a produção que o Conhecimento pudesse gerar. No entanto , não podemos ignorar que nós - os seres humanos , somos ativos, reflexivos e capazes de resistir aos arranjos sociais e tecnológicos. Ou seja , devemos nos lembrar que , pela nossa própria natureza , estamos a cada dia (re) criando as nossas próprias alternativas na busca das necessárias melhorias para a nossa existência no planeta. De uma forma geral, todas as áreas do Conhecimento têm sido desafiadas a se aproximar dos movimentos sociais , acenando com a criação de novas situações de aprendizagem. Nesse ponto, é interessante perceber que o nosso desafio mais concreto aponta para a formação de novas aptidões que sejam capazes de atinar para a compreensão de que existe uma relação entre as formas de aprendizagem e as formas de vida , já que , nos dias atuais não é mais possível separar os processos mentais dos processos biológicos nem estes dos processos sociais.
No que diz respeito a essa questão , pensamos que nós , espíritas , temos muito a refletir e discutir. Primeiramente, é de grande importância que tomemos para nós mesmos , a responsabilidade de meditar sobre a nossa condição e as conseqüências que essa ação traz para a nossa vida de relação. Na prática , o que propomos é que para que nos sintamos verdadeiramente espíritas , é necessário que nos apropriemos dessa condição . E o passo inicial que devemos dar nessa direção é buscar e conhecer todo o Conhecimento produzido que gerou o alicerce da nossa Doutrina. Mais precisamente , estamos falando do esforço que devemos empreender para conhecer e aprofundar o desenho das Obras Básicas de Allan Kardec . Acreditamos que essa preocupação deveria ser extensiva a qualquer um de nós pelos motivos já apresentados anteriormente. É necessário que façamos essa apropriação , justamente para evitar algum monopólio causado pelo domínio fechado desses conteúdos . Mesmo porque , em sua gênese , a Doutrina criada pelos Espíritos , traz em sua base o fortalecimento dos preceitos fundamentais dos ideais cristãos em todos os seus aspectos. Então , compreendemos que está nas nossas mãos , desenvolver as inúmeras possibilidades que pudermos imaginar para criar e recriar as condições necessárias para que todos nós possamos incorporar todos esses conteúdos ao nosso dia-a-dia.
Neste caso , podemos pensar em pelo menos duas estratégias . A primeira é a de estimular de forma bem significativa à criação , a estruturação e a manutenção de núcleos permanentes de evangelização de crianças e das juventudes nas Casas Espíritas. Essa é, sem duvida a mais consistente ação para o futuro . A outra , também essencial , a que mais nos deteremos por ora é a de disseminar o estudo sistemático e permanente dessas obras entre os indivíduos que se colocam espíritas e que se disponibilizam para as diversas atividades laborativas dentro da Casa Espírita , a fim de possibilitar através dessa ação , a apropriação da condição espírita a cada um desses sujeitos. Julgamos que assim poderemos impregnar toda a nossa vivência dos conteúdos fundamentais da Doutrina , fazendo uma espécie de aprendizagem significativa desses princípios através de uma mobilização vivencial , tomando por base as histórias de vida de cada um dos envolvidos , onde ao final , alcançaríamos e apreenderíamos em um nível individual , o necessário para a nossa ação que se mostraria mais qualificada. É um jeito de começarmos a exercitar a necessária transformação das nossas atitudes na direção da reforma que precisamos empreender , além de possibilitar Conhecimento e fundamentação à prática mediúnica. E nesse caso , estaríamos mais seguros do nosso ato , pois compreenderíamos mais e melhor – por conta do estudo e da identificação , cada uma de suas conseqüências.
Acreditamos firmemente que é o Conhecimento que sustenta e embasa a nossa ação e modela o nosso discurso . É esse discurso que nos qualifica para a vida de relação , para o trabalho e até para a sobrevivência no planeta. É importante que compreendamos que é esse discurso que fortalece a nossa ação porque está fundado no Conhecimento que o originou . Por isso ,precisamos conhecer sobre o que falamos e precisamos falar sobre o que realmente conhecemos . Devemos reconhecer nas nossas ações o Conhecimento que as produziu. A nossa prática / discurso deve ser o produto da maneira como nos apropriamos da realidade que nos cerca . A nossa realidade é permanentemente construída pela forma como produzimos a nossa sobrevivência . E é a nossa sobrevivência que nos impele a transformação desta realidade . Para tal , produzimos permanentemente estratégias – a produção e a apropriação do Conhecimento são algumas delas , que nos sustentam hegemonicamente num grupo social.
Para começarmos a falar especificamente no uso e na apropriação de toda produção do Conhecimento no campo da Doutrina Espírita,precisamos primeiramente reconhecer que é esse Conhecimento que sustenta a práxis no interior deste grupo . Devemos compreender que é o verdadeiro domínio desse conhecimento que constrói e legitima os procedimentos , as falas e as posturas entre os indivíduos pertencentes a esse meio . No nosso caso , por exemplo , podemos citar a crença na Comunicação entre os Encarnados e Desencarnados, a Reencarnação e a Lei de Causa e Efeito como premissas básicas à prática espírita . No entanto , precisamos sair desse nível de superficialidade para pensarmos no aprofundamento das nossas reflexões e atitudes , com vistas a uma ação verdadeiramente comprometida com o ideal transformador contido nas bases da nossa Doutrina. É fundamental também que comecemos a externar o compromisso que assumimos com o desenvolvimento da prática espírita em nós . Do mesmo modo , precisamos compreender que é essa apropriação que sustentará o nosso discernimento frente às questões que se apresentam no nosso dia-a-dia. Mais ainda , é esse Conhecimento que sustentará o “saber legitimado” pelo reconhecimento e identificação das nossas ações.
Antes de começarmos a pensar especificamente no tema principal, esclarecemos que o nosso entendimento sobre Educação Mediúnica abarca o conjunto de todas as ações relativas ao envolvimento do individuo com a Doutrina e não apenas o domínio e o desenvolvimento das práticas mediúnicas . Nesta oportunidade, aprofundaremos então alguns aspectos que precisam ser pensados e podem servir para o amadurecimento de algumas impressões acerca da questão principal que ora estamos tratando. O primeiro deles diz respeito as possíveis mudanças na nossa conduta causadas por nossas atitudes e comportamentos . Podemos pensar , por exemplo na qualidade dessas mudanças como decorrentes da nossa transformação , dando a elas significados especiais . Para o caso que estamos tratando , podemos pensar em mudanças simples ou radicais , mas significativas . E , se observarmos com calma , poderemos concluir que em todos essas oportunidades , a nossa mudança para ser consistente precisa estar fundamentada no que passamos a dominar . Podemos dizer então que ampliamos a nossa visão e o nosso entendimento acerca de uma questão , de um tema e até do mundo que nos cerca , na medida que nos apropriarmos do conjunto de informações que subsidiarão o nosso novo comportamento . Reforçamos , assim , a importância fundamental do estudo sistematizado e permanente das Obras Básicas da Doutrina a todo postulante espírita .
O outro aspecto que devemos observar está diretamente ligado ao primeiro , sendo mesmo conseqüente a ele e trata do uso prático deste Conhecimento – da base de nossa Doutrina , como verdadeiro sustentáculo da postura do espírita . Propomos que a partir da apropriação desta bagagem , nós passemos a nos esforçar para desenvolver uma atitude comprometida verdadeiramente com os ideais que passamos a professar . Ou seja , se somos espíritas , devemos agir como espíritas . Se escolhemos nos apresentar como espíritas , precisamos entender o significado desta autodenominação para a nossa vida de relação , afastando os possíveis conflitos decorrentes do pouco conhecimento que possuímos acerca da questão. Sem dúvida alguma , precisamos compreender mais e melhor a opção que estamos fazendo e as conseqüências práticas dessa posição. Teremos , então , a possibilidade mais concreta de desenvolvermos uma postura mais propositiva , consciente e crítica no trato com o desenvolvimento das nossas ações - tanto na Casa Espírita como em todos os outros lugares de convívio e relação , porque estaremos mais seguros . Como decorrência desse processo , as nossas atitudes estarão mais fundadas no Conhecimento que formos adquirindo e ao poucos passaremos a ser mais disciplinados , coerentes e claros em nossas atitudes e intenção. Na medida em que o aprofundamento do nosso compromisso for mais intenso – um outro aspecto que precisa ser trabalhado na construção da proposta que pensamos , as nossas atitudes estarão sustentadas por uma segurança conquistada pelo conhecimento de que estivermos nos apropriando. E assim , estaremos reforçando conscientemente o conjunto das atitudes dos nossos pares – sujeitos que compõem conosco o coletivo do grupo que pertencemos. Contudo, cabe ressaltar que , longe de criar uma igualdade de pensamentos , a nossa ação estará reforçando a nossa identidade social, produto dos nossos conflitos , das nossas discussões , das nossas ponderações e das nossas reflexões .
No entanto , precisamos observar um aspecto fundamental para o desenvolvimento desta proposta . Estamos falando do uso ilimitado do Amor . O Mentor de Chico Xavier , Emmanuel , para justificar o caminho que o homem deve percorrer para chegar à presença de Deus , fala da Sabedoria - vista aqui por nós como a apropriação do Conhecimento e do Amor como duas asas que nos conduzirão por esse caminho. Para ele , é pelo Amor que nós nos iluminamos e nos melhoramos por dentro . É o Amor que faz com que nos liguemos ao Alto e pensemos nos outros como nossos irmãos . É pelo Amor que nos valorizamos para a vida . É o Amor que nos aponta e ensina o caminho que devemos percorrer nas nossas oportunidades na vida . Mais ainda , para Emmanuel , se conseguirmos juntar as duas possibilidades , estaremos , pela divina reflexão, orientando a nossa conduta para a construção do Reino de Deus em nós . Por isso , para a efetiva aplicação dessas idéias precisamos compreender que a Doutrina Espírita é , antes de tudo, obra da Educação, integrando a alma humana nos padrões do Divino Mestre . Quando pensamos nos ensinamentos de Jesus , somos levados à imediata constatação que em cada um deles existia o Amor por cada um dos que conviviam com Ele . Mais ainda , porque as suas idéias transformaram o mundo , o seu Amor tomou uma proporção universal e atemporal . Assim , podemos compreender que quanto mais ascendermos e nos depurarmos – no nosso caso , pelo estudo e pela renovação , mais direto será o nosso contato com sua mente poderosa e com seu coração afetuoso. É nesse Amor - despojado de personalismo e egoísmo , que não se interessa em obter recompensas pessoais , mas procura apenas doar e passar ; em que não se misturam desejos doentios do orgulho de se querer modelar o outro à nossa imagem e jamais se preocupa com exigências ou cobranças de impostos de gratidão ; que vive com descontração, espontaneidade e leveza , mas que sabe se tornar sério e enérgico no momento de gravidade, não para obter algo em seu próprio proveito, mas ainda e sempre em benefício do ser amado ; que é acima de tudo, engajado na felicidade alheia e que não mede esforços, sacrifícios e oferendas para proporcionar todas as oportunidades de crescimento espiritual do outro , Herança do Cristo , que devemos sustentar a nossa proposta .Assim , se juntarmos Conhecimento e Amor , poderemos pensar em ações que extrapolarão em muito a concepção do processo educativo tradicional , já que estarão apoiadas em bases mais autênticas às nossas necessidades .
A primeira dessas bases diz respeito à indispensável vontade de todos os indivíduos envolvidos no processo . Afinal, conforme falamos no início , é fundamental que nos apropriemos desses conteúdos , já que eles dizem respeito ao Conhecimento produzido na nossa Doutrina. A segunda marca para a possibilidade de se pensar em espaços ampliados - locais aonde essas ações poderão se realizar . A nossa concepção de Educação propõe que não nos prendamos em reproduzir os espaços e as estruturas formais da Escola , observando principalmente as oportunidades ,as situações e o contexto aonde estas ações poderão se dar. Afinal , não estaremos apenas conferindo conteúdos prontos e acabados , mas acima de tudo estaremos compartilhando processos de evolução com entusiasmo e reconstruindo o nosso estado de espírito na busca de novas experiências . A terceira aponta para o desempenho dos indivíduos , neste processo .Todos nós deveremos ser sujeitos atuantes , vivos , participativos e críticos . Devemos nos lembrar que todos nós estaremos em busca da melhora e da renovação e então , (re) inventaremos juntos a alternativa que seja capaz de valorizar a contribuição que cada um de nós – individual e coletivamente puder apresentar . Todos , independentes de idade, profissão, condição social ou grau de instrução , poderemos ser sujeitos desse processo , na busca de apreender e construir em nós , o Conhecimento que trará a nossa transformação e afastará a acomodação, a mesmice e a rotina tão comuns aos processos tradicionais . Acreditamos que , desta forma , estaremos permanentemente estimulados ao estudo , a pesquisa e ao desenvolvimento das nossas melhores aptidões, partilhando uns com os outros um ideal de permanente progresso.

Para terminar a nossa contribuição , reforçamos mais uma vez a imperiosa urgência com que devemos nos debruçar a esta tarefa . Entretanto , ressaltamos que para a sua execução bastam apenas a vontade e o compromisso . A nosso ver , precisamos (re) começar esse trabalho , reforçando o que nos une – no nosso caso , a crença na Doutrina dos Espíritos , ao invés de avigorar possíveis e/ou eventuais diferenças que possam nos afastar desta tarefa tão promissora para a nossa causa. Acreditamos firmemente que a nossa vontade e o nosso compromisso serão os responsáveis pelas nossas atitudes e apontarão para caminhos pautados no diálogo , na compreensão e no desenvolvimento do nosso grupo , reforçando as nossas experiências , apontando as nossas dificuldades , promovendo a auto-educação , desenvolvendo a criatividade , valorizando o tempo e a dedicação de cada um , afastando o tédio e a insatisfação , criando apreço entre todos, melhorando o entendimento e a amizade , atraindo simpatia e colaboração e estabelecendo o respeito mútuo entre os indivíduos .